quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Retrocesso existencial...



Não foi por um mero acaso que me deparei com ele.
Tinha por volta de uns 36 anos, e os olhos castanhos claro denotavam a reprimida (mas feliz)infância, fosse nas oscilações de expressão,fosse na instensidade da luz.
Quem olhasse mais profundamente, poderia enxergar as marcas de um elemento etéreo submetido a viver nas dimensões terrestres, na diminuta esfera de seres humanos dissonantes. O modo como se vestia já não realçava mais sua presença, era tido como um descaso a lidar com o mundo das relações, um sem cor que vagava como um participante qualquer de uma festa que ele não reconhecia.
Não que não lhe dessem importância,pois estavam sempre a citá-lo como fonte de inesgotável saber e a ouvir suas estratégicas informações. Mas estava claro que ele não sentia os motivos para comemorar.
Em um desses dias abafados e nublados de verão que precedem uma primavera, que o encontrei. Era um verão inusitado de sinais ininterruptos, e o pouco sol a entrar pela janela deixou-o à vontade naquele limite de conhecidos e desconhecidos.
Eu o via como o eterno filho. Carregava ainda as broncas e o denso vínculo estabelecido desde o útero, aceitava com extrema e autêntica resignação aquele que seria o seu universo. Interno.
Submerso em questionamentos e preocupações, em suas meticulosas abordagens teóricas sobre o que era a vida, em seu incessante encaixe de suas novas aquisições culturais,deixava vagar pela esfera de sua duvidosa influência os sentimentos e tendências naturais que abrigavam sua voz recortada. Atrás daquele homem, eu via a dor a cada dia compactada , dor de quem caminha com a desconfiança de viver a expressão mais contemporânea de ser alguém que não deu certo. Sabe-se lá a relatividade da expressão em um ser que já havia buscado tantos caminhos. E eu o transformava agora em matéria prima de minhas observações.
Via que levava seu coração nos olhos,nas mãos ,nas manias e até mesmo nas asperezas cotidianas. Era mais um a clamar por atenção,tão isolado estava do mundo dos seres comuns,mas ao mesmo tempo tão próximo, lutando intimamente para re-conhecer-se como parte daqueles sistemas que tantas vezes negava. A negação nada mais era que a ausência sentida, a vontade de pertencer ao mundo dos mortais que amam,trabalham, voltam para casa cansados mas felizes por tudo que um dia ousaram enfrentar,mudar e conquistar. Tão isolado estava das normas sociais,tão imerso com aquele mundo dentro de si, rico e pobre, de visão além... mas gestos entrecortados que não escondiam a imensa e insana solidão de um ser mas denunciavam que, o mundo que havia fora do habitual e do comum desejava,ardentemente...abraçá-lo. Vivenciá-lo e mostrar nas lacunas que somente ele percebia,o que havia de mais além daquele isolamento,o que havia de mais além daquele unir-se sem a consciência,sem a experiência, sem a eterna marca de um dia ter realmente estado só...