sábado, 27 de dezembro de 2008

Receita para uma fuga


Ingredientes:
Sua vida, a vida de outras pessoas.
Livros, obras de arte, músicas e produtos de cerne humano.
Matéria prima de um ser vivo como a ignorância, o ignorar certas coisas, a pureza, a maldade,a bondade, e tantos outros pares de sentimentos opostos e características existenciais.Também opostas.
Instrumentos: É de suma importância uma peneira.
Recipientes: O mundo- Interno e externo.
Modo de preparo:
Agarre-se a uma idéia,causa ou motivo e renuncie ao seu ser mais completo.
Escolha acompanhar apenas uma personalidade e em nome dela,ignore outras. Permita assim,restringir sua visão do conhecimento.E claro, permita ignorar,primariamente,a si mesmo.Seja cópia e esqueça de quem você era quando nasceu.
Ande rápido ou devagar, sempre quando não precisa nem de um ou de outro.
Saiba os momentos errados para fazer a opção certa.
Não se esqueça de deixar de pensar no porquê evitar aquilo que te causa medo.
Se você não pensa, a assadeira permanece untada. 100% de sucesso de seu bolo alimentar crescer.
E bota bolo nisso.
Você dá o bolo no ex colega de trabalho que está atravessando a rua e você prefere fingir que não vê. E também naquele parente que um dia disse algo que te desagradou.
Não podemos esquecer daquele sujeito que não se encaixa nos seus padrões: nem os culturais,muito menos os sócio econômicos.Quanto atrevimento ele existir,não?
E as ocasiões em que você precisava ter atitude,ter uma postura,tomar uma decisão mas não tomou.
O diferente e ignorado dá o ponto exato da massa.
Lave bem o seu ego, e deixe de molho em partes grandes. Se ao peneirá-lo,tiver dificuldade,não insista. É de partes grandes que a fuga se realiza.

Entregue-se. Seja às drogas,ao álcool ou à comida.
É uma medida rápida de acelerar o processo de cozimento.

Siga as receitas. Incluindo a leitura das citações,sem conhecer a obra completa.
Isso acaba com o espírito perceptivo,mas com certeza fará um tempero único de hipocrisia, muito saboroso aos olhos da maioria, e sua receita se tornará muito maior e mais fofa.
Há os que preferem mudar a forma de lugar. Mas também os que nunca mudam,com medo de (se) perderem. Extremos que nem raízes nem asas,salvam da mediocridade. Não importa. Para esta receita , ter superstição também ajuda. É ,afinal,uma outra boa maneira de fugir.
Pegue alguns daqueles dias em que mais precisam de você e por medo,você não vai,sabe? Não fala,não ousa e enxerga até ao desperdício. Mas não usa.
Lembre-se da dica inteligente da cozinha da vovó: Aquilo que não se utiliza...acaba estragando...se passar do ponto de acrescentar,e da quantidade, a massa não vinga.
Refogue as suas mágoas,exclua os nutrientes do recheio e fique com a casca.
Leve ao forno e acrescente uma camada de fixador de máscaras para viagem.
Não tente desenformar e, se for preciso, asse sobre a brasa do carvão.
Firme bem para que não caiam as partes do bolo. Afinal,ele não tem pontas para serem afinadas.E quanto mais reto e enformado,melhor para servir.
Sirva à vontade até que seja tarde demais para que sua consciência acorde.
Espere as visitas deixarem a festa e logo adormeça.
Isso garante o "Grand Finale" de qualquer vida.
(E não abuse demais porque um pedaço de fuga é suficiente para causar indigestão).
Bon'apetit!

sábado, 20 de dezembro de 2008

Luzes sem brilho...


É fim de ano.
Estamos a poucos dias do Natal e já sinto um certo desespero ao lembrar dos "cumprimentos" que a data exige.
Exige?
Bem, talvez não existam exigências a pessoas que se propõem a ser transparentes e solícitas com a verdade.
Conheço,porém, as intimações que as aparências tanto fundamentam e mantêm,no que chamamos de nosso "ciclo social cotidiano".
Pertencem a ele as pessoas que convivemos. Ou as que nem quase convivemos, mas que julgam nos conhecer o suficiente para darem palpites insuficientes em nossa vidas.
Tantos são os "Feliz Natal" e "Boas festas" que nos chegam de pessoas assim que, por amor ao propósito da data prefiro ignorar.
Porque "cumprimento" é também o ato ou efeito de cumprir uma responsabilidade.
E é uma obrigação moral e espiritual ser coerente consigo, cumprir com aqueles sussurros da consciência que só a gente ouve quando lê e interpreta por e a partir dela, as palavras e ações de Cristo.
Costumamos pensar na suposta "magia" que esta data nos tráz, e como no carnaval é permitido à consciência doses homeopáticas de esquecimento, aqui nos permitem, com a "graça consumista da festa", doses cavalares de indiferença à falta de atuação que plantamos ao longo de trezentos e tantos dias.
O espírito que as pessoas ficam é bonito mas já presenciei que ele pode nem mesmo perdurar até a meia noite.Para que então fingir que durou um ano inteiro a ponto de me fazer desejar felicitações que não sinto vontade nenhuma de desejar? Você já ouviu algo como :"Vamos aproveitar o tal espírito do Natal pra voltar a falar com ele, com ela? Com pessoas que por meses não houve meio de reconciliação?... Hohoho. Papai Noel riria longa e amargamente com tanta hipocrisia.
Como bem citado por meu amigo Marcelo,o Natal lembra livro O Perfume:"Num dia a orgia.No outro todos ignoram os problemas do próximo".
Ao tal inconsciente coletivo(que não acredito tão inconsciente assim) é permitido redimir-se na data do instituído nascimento de Cristo,mas havemos de convir que ser completamente remido envolve a duração e persistência da bondade...
Não esqueçamos das situações que nossa modesta situação econômica de sobreviventes nos coloca e principalmente das crianças que, sem entender o motivo das gritantes diferenças e do "por que não ter aquele presente ou doce que eu queria?", plantam em si grandes sementes de rancor.
Penso que se para cada palavra falada ou para cada aperto de mão dado houvesse uma reação em cadeia que demonstrasse cada omissão cometida ,mentira ou hipocrisia vivida, não faltariam tremores na terra, ou enchentes e respostas de nossa mãe terra para consagrar de vez a "paz na terra entre os homens de boa vontade".
A mim, um basta aos discursos vazios e às vozes silenciadas.
Porque das migalhas das luzes de Natal não se faz consciências livres. (E como não resisto, cito novamente meu amigo Marcelo: Vamos rezar pra dar um apagão no natal? Topa? Rsrsrsrs.)
Nem das hipocrisias póstumas do ano que não é mais novo, se faz vidas autências.
Se neste fim de ano,onde tantos balanços são prováveis e possíveis, para de fato transformar as relações,posso me abster de mentir,assim o faço.
Que o sentimento de Natal seja instalado em nossas vidas diárias e o balanço da virada do ano, a cada noite em nossos travesseiros. Não há maneira mais intensa e verdadeira de alcançar a paz de espírito e a certeza de se ser sinceramente feliz.